sexta-feira, junho 01, 2007

As conversas são como as cerejas, vêm umas atrás das outras. E os pensamentos, são como o quê?


Ontem à noite, comia cerejas e pensava...

Que raio, um fruto tão bonzito de se comer e daqui a uns dias metade deste carrego enviado pela minha avozinha querida, está a modos de ir para o compostor (tomara-o eu cá em casa! Seria sinal de que vivia numa propriedade, para os meus horizontes, latifundiária. Bom, mais ao meu nível, numa casa, pelo menos com quintal... vá um espaço com alguma terra... pronto, pronto, ok, com um vaso...). Ainda mais com a chuva que apanharam nos últimos dias que vai ajudar em muito a rapidez de putrefacção da fruta...

Era isto que estava a dar ontem à noite, no silencio das quatro paredes envolvidas pela noite, só interrompida pelo cair dos caroços e talos no prato que se ia enchendo deles... Não só... Existia também um barulho irritante, desgostante e perturbador, originado no mastigar, das cerejas, sinal de um sub-urbanismo e maus modos que caracterizam os habitantes do deserto (disse o Sr. Ministro), em que repentinamente se transformou a margem sul do Tejo, por acção apenas de um conferencia de imprensa.

Uau, isto é que é poder, nem o Jesus Cristo nos seus tempos aureos conseguiu tal feito!

Alguns apenas... Apenas alguns dos habitantes... Vá em determinada rua apenas... Pronto, na rua que percorro, todos os dias, no número em que entro, todos os dias, no andar em que dou uso à chave que trago no bolso e me abre a porta de par em par. Todos os dias...

Às vezes entro já noite, muito noite, de tão noite que o céu já tem tons de um azul escuro, permite vislumbrar o horizonte no qual juro ver cerejeiras carregadinhas delas em vez dos prédios sujos de sempre, entro e como cerejas... E penso, penso muito na vida e acabo sempre por perceber que as cerejas duram pouco e que a chuva ajuda, ainda mais, à festa e que nesta festa toda, lá estou eu a comer cerejas, antes que as mesmas se degradem. E aproveito para pensar: Que pena... Um fruto tão bom e daqui a nada está tudo estragado...

Sou apanhado nestas coisas e o tempo passa sem eu dar conta, tempo esse em que o pensamento passa de uma cereja boa, para outra estragada e outra ainda, menos mal em que ainda se consegue, com ajuda de uma destreza dental acirradíssima, abocanhar ainda e apenas a parte boa da coisa e desperdiçar menos. É que, já vos tinha dito que as cerejas duram pouco? Há que aproveitar!

Estive a pensar nisso ontem à noite, já a noite ia longa, longuíssima, tão longa que já se confundia com o dia e nisto... acordei com sono e com vontade imensa de comer cerejas.

Fui até à cozinha, arastei os pés pelo corredor e vi a fraca figura de quem acorda já cansado devido a uma noite longa ou será longa noite? Noite de poucas horas de sono e muitas de farta actividade cerebral e devorativa.

Raio de onde me vem esta cisma com cerejas, logo de manhã, se nem as tenho cá em casa?

Vi um prato cheio de caroços e talos, de cerejas, pois claro; afinal, pensei mesmo em cerejas longas horas a fio, comi-as mesmo e bem, a julgar pelo prato cheio, bem cheio por sinal, de resquícios do que já foram cerejas completas e das quais restam os caroços e os talos e alguns pedaços já em putrefacção...

Epá tenho o frigorifico cheio delas!!!

Não sonhei... As cerejas... Nem com cerejas... Elas estão mesmo cá, existem, posso-as agarrar e comer, às mãos cheias, alarvemente, cerejas e mais cerejas, até ficar farto delas, rebentar, enjoar, detestar...

Vou comer mais umas!

É que, se calhar não sabiam mas, coitadas, duram pouco, muito pouco... E só para o ano é que há mais, não destas, mas doutras que têm o mesmo nome, qual sina, e que estarão condenadas a terem a mesma duração efémera...

Aaaaahhhhhh, como gosto de cerejas!

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