quarta-feira, março 21, 2007

Vontade do homem vs força da natureza


Nos anos 80, um homem chamado Carlos Pimenta (comummente chamado e conhecido por Pimentinha), oriundo do Barreiro, tornou-se Secretário de Estado do Ambiente, nos Governo de Cavaco e Silva.

Este homem foi o pai das demolições de construções clandestinas na Fonte da Telha, Portinho da Arrábida e Ria Formosa, altamente cobertas pela comunicação social, tendo um enorme impacto sobre a actualidade do país, naquela altura. Tarefa monstruosa, esta! Todos tinham uma destas belas habitações de férias, ou todos conheciam pelo menos alguém que tinha, um amigo, etc. Iria mexer com certeza com “peixe graúdo” e, em Portugal, sê Português e como “é melhor ter amigos que inimigos”, ninguém queria sequer falar deste assunto, quanto mais resolvê-lo.

Foi o que fez o Carlos Pimenta! Congregou os trabalhadores, bulldozers, escavadoras, camiões e demais artilharia pesada e resolveu o assunto pronto como se queria. As paisagens ficaram livres do casario abarracado e todos ganhamos com a libertação. O espaço público marítimo é, como o próprio nome indica, público e foi-nos restituído a todos, aquilo que é de todos.

Claro que o bom do Carlos Pimenta não esteve lá muito tempo. Mexeu onde e com quem não deveria (deveria, deveria e fez ele muito bem e apenas e só aquilo que lhe competia! Mas os interesses instalados, já nesta altura eram fortes e têm-se fortalecido com o passar dos anos, tornando-se escandalosos, nalgumas ocasiões, nos nossos dias) e foi substituído, na sua Secretaria de Estado, por outro (Macário Correia, mas pouco importante para o desenrolar da história).

Toda esta introdução para recordar um homem que fez obra, talvez o único homem que fez A obra que se impunha, no ambiente em Portugal. Há que respeitar o que está legislado, o que é de todos e abusos não podem ser permitidos. Correcto.

Uns tantos anos depois e em pleno século XXI, tantas e tantas evoluções tecnológicas depois e tantas e tantas outras evoluções e emancipações conseguidas pelo homem, integrados que estamos na Europa Comunitária, utopia evolutiva desejável (digo eu, ou não), temos situações que ainda urgem resolver, nesta vasta área, vastíssima, do ambiente.

Uns tantos anos depois, temos problemas com as barreiras dunares da Costa de Caparica e que põem em risco um Parque de Campismo naquela zona. Um Parque de Campismo que se situa a escassos metros do que seria uma praia e não o é, porque o dito Parque está em cima daquilo que o seria e não pode ser! Ou seja, a praia não existe porque no lugar dela foi construído um Parque de Campismo e, para proteger o Parque do mar, foi criado uma barreira de areia e pedras, para que a água não invadisse o Parque.

Parque, em itálico... Porquê?

Diz o dicionário que um Parque de Campismo é uma coisa onde as pessoas vão acampar, pressupõem-se de tenda, roulotte ou de outro qualquer meio móvel e não onde as pessoas habitam permanentemente. Ora o Parque ameaçado da Costa de Caparica, não o é! Há pessoas que lá habitam permanentemente, há poucas roulottes ou tendas, sendo a maior parte “barracas” com estrutura de ferro e lona, amovíveis, é certo, mas não móveis... Ora, de Parque de Campismo, o referido Parque terá pouco. Aliás, basta consultar o site do Clube de Campismo de Lisboa (entidade responsável pelo Parque), para o ver as “casas sobre rodas” que ali alugam (mas na verdade vendem, sob o pretexto de estarem a alugar o espaço que a casa ocupa)...

A juntar a estes dois pontos, quase insignificantes, não fossem os dois entroncar em gritantes ilegalidades, acrescenta o facto de nem todas as pessoas puderem usufruir de um espaço que está dentro do espaço público marítimo e que, como o nome indica, seria público (será que foi por aqui que eu já li isto?) e não de uns ou outros ou de associações, agremiações ou grupos de pessoas que gerem o espaço que não é deles, mas sim de todos e que todos estão privados de utilizar, excepto os “gatos pingados” que pertencem ao grupo dos que usurparam o local público ou do povo, que não pertencendo a esse grupo, terá que pagar mais daqueles que pertencem! E se eu quiser ir passear por ali e não quiser pagar? Resposta óbvia!!!

Qualquer semelhança com o que se passava na Fonte da Telha, Portinho da Arrábida ou Ria Formosa, nos tempos do Carlos Pimenta, é pura coincidência e meramente fictícia. Ah, existe uma diferença; estes pagam! Mas pagam a quem não devem e por um local que não é alugável sob renda alguma, se não, não seria público, digo eu...

Com certeza que haverá alvarás e licenças e tudo o mais para que este Parque ali esteja, coisa que as pessoas individuais que foram visadas pelas acções do saudoso Secretário de Estado do Ambiente não teriam, com certeza, não duvido. Duvido sim é da sua legalidade e legitimidade! Quem as passou? Porquê? Quando? Como? Porque é que ainda não se fez nada, nestes anos todos? Vai continuar ali a estar o Parque?

Ajudando a tudo isto, sabendo que o mar, indicam os estudos, está a subir uns milímetros por ano, parece-me que é uma luta inglória e que, mesmo que agora se consiga, com paredões ou outras medidas apregoadas por tudo o que é “entendido” no assunto, mais uns anos de tréguas das invasão por parte das águas, a longo prazo, o Parque não ficará ali... Nem o Parque nem nada! Certo?

Ainda vou alargar mais o assunto... Baralhar ainda mais as cartas, voltar a dar e ficar tudo na mesma...

Na Costa de Caparica e na extensão que dali se estende até ao Cabo Espichel, melhor, desde a foz do Rio Tejo, até à foz do Rio Sado, temos uma área de paisagem protegida. Chama-se Área de Paisagem Protegida da Arriba Fóssil de Costa de Caparica. Ora como se forma uma arriba? Alguma coisa, provocando o desgaste do terreno, provoca uma “fenda”, um corte abrupto na morfologia do mesmo, originando a arriba. Ora, conhecendo a Costa, o que poderá ter provocado esta arriba? Ali não passam rios, não há lagos, que se saiba ninguém com bulldozers por ali andou a escavar, por isso, parece-me que só resta uma alternativa... Conseguem adivinhar? Ah, esse mesmo, o lindo oceano Atlântico, foi ele o autor, o responsável pela Arriba Fóssil de Costa de Caparica! Ele vai lá chegar novamente, nem por sombras o iremos conseguir deter...

E mais! Quem se recordar dos finais dos anos 70, inícios dos anos 80, portanto ainda anterior ao ex Secretário de Estado Carlos Pimenta, sabe perfeitamente que o centro da Costa de Caparica já sofreu do mesmo mal. A zona em que agora temos alguns bares algumas barracas de pescadores, o famoso Barbas, etc. Nem sempre foi assim... Não existiam os pontões nem a barreira de pedras que protege a vila. O problema que agora temos com este Parque e toda a zona da Costa para o lado da foz do Rio Tejo de erosão grave, se passou com o centro da Costa de Caparica. Isto ensinou-nos alguma coisa? Aparentemente não...

E quem conhece a Costa de Caparica e retorna lá de tempos a tempos, vê que, ano após ano, as praias da Costa (CDS, Dragão, ...), vêem diminuindo o areal assustadoramente, deixando de existir por completo com as marés cheias, mesmo no verão. À uns escassos 15 / 20 anos isso não acontecia... Recentemente a Câmara Municipal de Almada teve que refazer todo o paredão que protege a vila e os pontões que tentam quebrar o ímpeto do mar, mais ao largo...

Tudo isto e não estando contra as pessoas que lá têm tendas ou o que for, apenas contra a existência do Parque onde ele está e como está e nas circunstâncias que está, lamento que estejam a ser gastos rios de euros para tentar deter as águas de tomarem o lugar que foi, não é, mas será delas. A curto prazo é a medida que urge tomar e que se tem que tomar, mas parece-me que o pensamento serve não só o imediato, mas o futuro distante e isso sim assusta-me. Quanto é que continuará a ser gasto neste jogo do “retira e dá”, como solução teimosa e tendencialmente definitiva? As pedras, pés de galos ou paredões serão melhor solução? Não acho...

Tentar segurar as águas o melhor que se conseguir e retirar o Parque para outro sitio parece-me uma melhor situação, mais lógica, mais contida, menos megalómana e muito menos dispendiosa. Não se fará hoje, nem para a semana, nem tão pouco neste ano ou anos seguintes, mas tem que se fazer! Porque não pensar já num plano que isso englobe, a longo prazo, racional, pró activo e não reactivo? Não sou fatalista nem quero nada fazer porque são poucos que estão a gastar o dinheiro dos nossos impostos, etc, etc. Seriam argumentos fracos, populistas e demagógicos unicamente para gerar confusão em vez de solução, dispersão em vez de consenso.

Quero ver uma solução, uma obra, um resultado, sim. Mas uma coisa consistente, pensada e executada, não atitudes passivas e irresponsáveis de deitar areia sobre a água (normalmente seria água sobre a fervura), desperdiçando engenho e arte de uma solução que o homem será capaz de, consensualmente, encontrar. Não se pode, neste e em muitos outros casos, estreitar a discussão num ponto em que os interesses pessoais possam ter o papel principal, porque corremos o risco de não sairmos do mesmo sítio e falarmos todos para o seu umbigo (interesses, leia-se).

Por isso mesmo e achando que o Parque não deveria estar ali, mas que não pode sair dali à pazada e sem planeamento, achando que não é deitando toneladas de areia que o mar vai “recuar”, mas também não é não repondo a areia que atingiremos a solução que espero, espero (e gostava ainda mais que isso acontecesse), que todos se venham a entender e a solução encontrada em conjunto. Não podemos estremar as coisas de modo ao Parque não sair dali porque tem direito a ali estar. Porque senão podíamos dizer-lhes que então eles que reponham a areia e paguem eles as obras... Será que iriam lá estar muito mais tempo?

Vamos ver quem ganha neste caso: a vontade do homem ou a força da natureza... Afinal é isto que aqui está em questão, e não guerras entre pessoas com diferentes interesses ou pontos de vista. Por experiências anteriores já sabemos qual será o resultado, mas teimamos em competir com aquilo que sempre nos venceu e vencerá e, mais grave ainda, puxando cada um para o seu lado!

Boas meditações...

1 comentário

Vera disse...

gostei msm deste post!!

aprendi coisas que desconhecia totalmente e acho que não tinha ainda opinião bem formada sobre este assunto.. mas o texto deu-me que pensar e já cheguei a algumas conclusões.. :)

é por isso que gosto de vir aqui a este cantinho..

*beijinhos*